André Macedo, no seu editorial do Dinheiro Vivo de 16 de março, fala do perigo de o radicalismo económico de Vítor Gaspar levar, por reacção, as pessoas a rejeitarem «as economias liberais, a concorrência, o capitalismo, até as instituições democráticas».
Esse perigo é real, pois as pessoas têm a tendência de ver dicotomias em tudo: se uma ideia é errada, uma outra ideia que se lhe oponha será necessariamente certa.
Pude verificar (sem surpresa) essa tendência para a ultrassimplificação das questões na semana que antecedeu a grande manifestação de 15 de setembro: no Facebook defrontavam-se, por vezes com grande violência verbal, dois campos antagónicos, não raro constituídos por “amigos”. Uns, que com enorme facilidade passavam da oposição ao Governo e à Troika para a apologia da Cuba castrista e outros comunisms serôdios. Outros, que vendo comunistas e anarquistas em tudo quanto era canto (mesmo que tal visão fosse muitíssimo redutora e por isso injusta), fincavam pé quais irredutíveis gauleses, repetindo o mantra de apoio a Gaspar mais para se convencerem a si próprios do que à sua audiência; uma táctica alternativa era a de desviar as atenções dos erros presentes, berrando bem alto a denúncia dos erros passados.
A propósito deste triste espectáculo, escrevi no Facebook a 14 de setembro de 2012 o post que a seguir reproduzo.
Há muitas formas de estar errado
Um artigo no Público espanhol diz que a crise deu força a quem rejeita o Capitalismo. Será verdade, mas é um erro.
Um amigo meu aqui no Facebook, de Direita, posta uma imagem que compara o número de Parcerias Público-Privadas celebradas nos governos PSD (Cavaco Silva, Durão Barroso/Santana Lopes) e PS (Guterres, Sócrates): sendo os números correctos (não sei), o regabofe foi uma ordem de grandeza (i.e., 10x) superior durante os governos do PS. Ainda que o gráfico seja verdadeiro, a extrapolação (implícita) do meu amigo está errada.
O mundo é mais complexo do que, à esquerda e à direita, alguns nos querem convencer. A ideologia e a prática política e económica não são dicotómicas, não são binárias. Se uma está errada, a outra não está consequentemente certa.
Há muitas maneiras de estar errado.Não foi por combater Hitler que Estaline estava certo, nem foi por Estaline estar errado que Hitler estava certo. Estavam ambos errados e ambos estão no top dos Criminosos contra a Humanidade.
Não é por o sistema soviético ter colapsado sob o peso dos seus próprios princípios errados que as variedades selvagens de capitalismo são aceitáveis. E não é por existir capitalismo selvagem, exploração e cegueira ideológica à Direita que o regime soviético, o marxismo-leninismo ou a Ditadura do Proletariado devem ser reabilitados da fossa séptica da História, como se à Esquerda não tivesse havido também a sua enorme dose de selvajaria (colectivista), opressão e cegueira ideológica de sinal contrário.
Há muitas maneiras de estar errado.De igual forma, não é por os Governos PS terem sido despesistas e dominados por golpistas, ladrões e gajos de “esquemas” que o actual Governo do PSD está livre do mesmo mal ou está certo na (der)rota que está a desenhar para Portugal.
Há muitas maneiras de estar errado.As práticas económicas dos bancos de “investimento” que vivem da especulação e do ataque cerrado às economias frágeis e expostas, na mira exclusiva do lucro a (literalmente) qualquer custo (para os outros, isto é, nós), estas práticas não são “O Capitalismo”. São apenas uma forma perniciosa e infestante de prática capitalista. Metê-la no mesmo saco de outras práticas de capitalismo, pretendendo que todo o capitalismo é selvagem e esquecendo o desenvolvimento que ele trouxe, resulta no mesmo erro ou falácia de meter no mesmo saco a Marcha da Morte imposta aos seus prisioneiros pelos japoneses, a prova atética radical da Ultra-Maratona ou uma peregrinação a pé pelo Caminho de Santiago...
Sou pelo Capitalismo — mas não este, ruinoso.
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