domingo, 17 de março de 2013

No final de contas...
(contextualização)

Os leitores mais atentos e informados poderão ter detectado algo de estranho no post do Paulo: como é que Pedro Passos Coelho, que apenas se licenciou em 2001 (com 37 anos), em Economia, pode ter sido professor de Matemática do 9.º ano numa altura em que teria uns 19 anos?!

Os ainda mais informados (nomeadamente os que viveram esse anos do início da década de 1980) saberão a resposta. Para os outros (mais novos ou mais esquecidos), fica aqui a contextualização.

Até ao 25 de Abril a educação após a 4.ª Classe (actual 1.º Ciclo) era só para alguns, poucos. Com a Revolução dos Cravos deu-se a democratização do ensino: quase de um dia para o outro, as escolas foram inundadas por um súbito influxo de novos alunos. Portugal não estava preparado para tal: simplesmente não havia suficientes professores qualificados para tanto aluno (em especial no interior do país).

Ora, quem não tem cão, caça com gato: quem não tem professores qualificados, recorre a cidadãos desqualificados. (Já estão a ver como isto vai dar a Pedro Passos Coelho, certo?)


Com a classe política passou-se um pouco ao contrário. Após o 25 de Abril havia uma classe política qualificada, concordasse-se ou não com as suas ideias: de políticos da ala “liberal” do antigo regime (por ex., Francisco Sá Carneiro), passando por advogados com actividade de defesa dos presos políticos (por ex., Jorge Sampaio), até políticos com passado de actividade clandestina anti-regime (por ex., Mário Soares e Álvaro Cunhal).

Enquanto as décadas de 1980 e 1990 foram de intensa formação de novos professores, devidamente qualificados, que foram substituir os desqualificados do início do ensino democratizado, no campo da política esse mesmo período caracterizou-se pelo envelhecimento e gradual afastamento da classe política do 25 de Abril. Entretanto, na forja das “Jotas”, (de)formava-se a classe que iria substituir os pioneiros.

Chegados ao fim do século XX e início do actual, os nossos governantes mudaram de perfil: em vez dos advogados, sociólogos, engenheiros com experiência de luta pela democracia, lidera-nos uma cáfila de desqualificados, cuja única real experiência de vida é a obtida nas «academias da politiquice prática» que frequentaram na juventude, com posterior especialização em tachos conseguidos por favor político. (Quase todos têm, no papel, um grau académico, mas pelo menos para alguns, como sabemos, também isso fez parte dos favores políticos recebidos.)


Eis, pois, como Pedro Passos Coelho conseguiu o feito raro (esperemos...) de, em alturas diferentes da sua vida, exercer desqualificadamente duas funções públicas: no Ensino e na Política. Para mal dos nossos remédios.

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