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sábado, 9 de janeiro de 2016

Cortesãos de esquerda

A esquerda também tem os seus cortesãos, a quem as baixezas da democracia incomodam. Eduardo Pitta, no seu blogue, escandaliza-se com a permeabilidade de coador furado do Tribunal de Contas, no que se refere a filtrar candidatos às presidenciais, e vai daí faz birra e não assiste a nenhum debate, talvez boicote mesmo as eleições.

Eu também me escandalizo com o facto de ter havido 7.500 portugueses que subscreveram a candidatura de Tino de Rans. Para humor e nonsense ficaria bem mais aliviado (entusiasmado, na verdade) se 7.500 portugueses tivessem subscrito uma candidatura de Manuel João Vieira. Seria uma indicação de que alguns dos nossos compatriotas distinguem a sátira da anedota, a inteligência da brejeirice. Seria uma indicação de que uma quantidade apreciável de portugueses, se não se importa com o governo da pátria, é pelo menos criteriosa no que concerne à derrisão da pátria.

Contudo, não creio que as assinaturas e o mau gosto de uns tantos (lembro que o sistema é Democracia) poluam as assinaturas que habilitaram outros candidatos, até aos meus olhos mais apresentáveis. Elogio, aliás, o estoicismo e a polidez com que estes aceitaram todos os debates. De resto, só vejo os debates que quero e voto igualmente em quem quero. Se por alguma razão paranóica ou hipocondríaca eu temesse contágios bacteriológicos da ralé por simples contacto com o boletim de voto onde aparecem tão vis figuras, procuraria desde já umas luvas de cirurgião que dissessem bem com a minha toilette de 24 de Janeiro. Eduardo Pitta, não querendo da sua tribuna ajudar a esclarecer o eleitorado, pode cobrir da mesma forma os seus apêndices e poupar o país ao seu pedantismo e ao seu paternalismo. Portugal não são aqueles 7.500, 15.000 ou 22.500 portugueses que ele como eu execra. (Embora às vezes pareça, é certo.)

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

João Miguel Tavares segrega pessoas de estatura mediana

Aborrecido com o hábito de ainda se confundir a direita com os ricos e a esquerda com os pobres (a quem ocorre tal coisa?), João Miguel Tavares resolveu introduzir um novo «eixo político» para separar as águas de forma mais democrática, digamos. Esse novo eixo dividiria o espectro político em «alto/baixo». Ouçamo-lo: 
«Neste novo “alto” poderíamos incluir tanto a habitual casta económica e política, como os detentores de privilégios corporativos, os burocratas que dificultam a livre iniciativa ou os especialistas na arte de fugir aos impostos; enquanto no novo “baixo” poderíamos colocar não só os pobres, mas também os reformados que se sentem espoliados, os jovens que nunca conseguiram um emprego, e todos aqueles que vêem a sua ascensão social dificultada pelas mais variadas redes de interesses que dominam os estados contemporâneos.»

Ora, a não ser que JMT reconheça que todas as pessoas honestas e boas são pobres (o que se diria uma surpresa na sua mundividência), esta nova divisão acrescenta a um novo maniqueísmo uma omissão ou um estigma. Um tipo que mantenha um emprego conseguido por mérito e não passe fome ou não existe no Portugal tavaresco ou é detentor de um privilégio corporativo, um burocrata que dificulta a livre iniciativa, enfim, um especialista na arte de fugir aos impostos. Acreditando que JMT não se vê a si mesmo como uma destas pessoas, temos de concluir que faz parte da habitual casta económica e política. Ou então é um pobre, já que não parece um dos reformados que se sentem espoliados nem um dos jovens que nunca conseguiram um emprego. A não ser, claro, que Tavares se sinta como um daqueles que vêem a sua ascensão social dificultada pelas mais variadas redes de interesses que dominam os estados contemporâneos e aí está tudo explicado, incluindo a sua divertida proposta taxonómica.

O Brecht dos bons observadores

Observador é uma bela ideia na imprensa portuguesa: junta num mesmo antro uma quantidade jeitosa de situacionistas. Torna-se mais fácil evitar a seita quando sabemos onde ela se acoita e é também mais simples mantermo-nos actualizados (basta um clique) quando, enquanto verdadeiros democratas, procuramos a nossa dose higiénica de contraditório. (Na verdade, não é bem isso que ali se procura, não vale a pena sermos generosos — nem escondermos a nossa compulsão pornógrafa.)

Numa das produções recentes daquela folha online lemos de um tal Mário Amorim Lopes: 
«Quando financiamos uma peça de Brecht de um qualquer encenador que jura que a cultura deve ser financiada por todos nós, podemos estar a reduzir os recursos disponíveis para mais um tratamento que possa salvar mais uma vida. E sacrificar a vida de uma criança é um preço demasiado elevado a pagar.»*

O parágrafo é todo um programa — e de uma subtileza antológica. Imagine-se que o rapaz escolhia outro dramaturgo; por exemplo, um daqueles gregos um pouco menos odiados pela direita Observadora: Sófocles, Eurípedes. Ou o inglês Shakespeare. O sofisma teria um impacto diferente. Aqui e ali, um ou outro velho conservador torceria a sua penca, sentado em frente às prateleiras de bom carvalho da biblioteca do solar. Um clássico grego é um clássico, raios, e Stratford-upon-Avon não é assim tão longe de Oxford. Há sempre uma criança que se pode sacrificar para salvar os clássicos, como sabia Churchill. Com dramaturgo de outra família literária, o voluntarismo do neófito seria remetido para a gaveta das inanidades próprias da juventude. Mas ele soube jogar em terreno seguro e lá colheu as suas palmaditas nas costas.

Jogou aliás tão pelo seguro que usou para sofismar esse democraticamente odiado universo da performance teatral. Imagine-se que ele tinha dito, por exemplo, quando financiamos uma apresentação da 9.ª Sinfonia de um qualquer maestro que jura que Beethoven é património da humanidade e a sua interpretação deve ser financiada por todos nós, podemos estar a reduzir os recursos disponíveis para mais um tratamento que possa salvar mais uma vidaHaveria por certo chatice da próxima vez que o avô descesse à capital para a sua ida sazonal ao S. Carlos.
Ou imagine-se que Amorim se atrevia ainda mais, num acto de verdadeira rebeldia juvenil (hipótese meramente académica, já se sabe), e saía para outros campos semânticos: quando financiamos uma empresa que paga impostos na Holanda, podemos estar a reduzir os recursos disponíveis para mais um tratamento que possa salvar mais uma vida. Ou, já num assomo de loucura: quando financiamos pornograficamente prémios a gestores, podemos estar a reduzir os recursos disponíveis para mais um tratamento que possa salvar mais uma vida. E sacrificar a vida de uma criança para enriquecer uma classe não raro incompetente e criminosa que se julga incensada e merecedora de todo o dinheiro que nega aos outros é um preço demasiado elevado a pagar.

Mas não. Quem escreve no Observador não se atreve a boutades divertidas como estas. Os bons conservadores preferem piadas onde se bate sempre no ceguinho do Brecht (aliás felizmente já tão pouco habitual nos teatros quanto decerto o próprio Amorim Lopes).


*A prosa tem um contexto alegadamente racional que pode ser livremente aferido aqui: http://observador.pt/opiniao/quanto-vale-uma-vida/

sexta-feira, 20 de junho de 2014

O Tua e a sua canção (ou)vistos pela nova direita

Um grupo de artistas dedicou uma canção ao Tua. A Helena Matos já deverá estar a escrever no pravda da nova direita um artigo a defender que se afogue não só o vale como os artistas. Se faltavam motivos para construir a barragem, dirá ela, agora temos um. João Miguel Tavares, pelo seu lado, pessoa sensível, aumentará o caudal do Tua com uma lágrima ou duas pelo vale e pelos artistas, mas lembrar-lhes-á a sua culpa por canções e paisagens belas serem actividades condenadas num Portugal falido.
Pedro Lomba dirá num briefing falhado que os artistas deviam era estar a contribuir para a demografia fazendo filhos enquanto a água não os cobre. Poiares Maduro tentará tirar-lhes o subsídio de férias e Passos vender-lhes uma formação em aeronáutica que lhes permita emigrar a partir de qualquer aeródromo das redondezas. Que os há-de haver.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Prioridades

Certos tipos de direita preferem passar o tempo a lembrar uma e outra vez como tinham razão e a “Europa” estava colada com cuspo do que a pensarem a Europa de novo tenebrosa que aí vem. É saber antigo: as prioridades de um ego inchado transformam a pessoa inteligente num idiota útil.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Os heróis e os cabos de João Miguel Tavares

A direita tem com o 25 de Abril uma relação difícil: ou o odeia ou o desvaloriza. Por vezes surge uma inesperada e comovente apropriação, como a do secretário de estado Pedro Lomba. No Público de terça-feira, João Miguel Tavares, outro jovem turco da direita, foi mais fiel à ortodoxia da tribo, mas nem por isso foi menos enternecedor. Munindo-se das ferramentas da condescendência e do lugar-comum, temperadas com uma pitada humorada de literatura, Tavares informou-nos que o 25 de Abril, ao invés de uma Revolução, foi um caso de não-acção típico dos portugueses. Para esta sua tese, elegeu como episódio central e representativo do movimento das forças armadas o do cabo-apontador Alves Costa — que se fechou no tanque para não ser obrigado a disparar, tal como conta o livro Os Rapazes dos Tanques. João Miguel reproduz o episódio, relaciona-o com a idiossincrasia lusa e culmina aquela secção do artigo com um lapidar «E assim se fez Abril».

Percebo que a vivacidade de algumas fotos do 25 de Abril seja perturbadora, e que certas pessoas, arrebatadas pela tensão das imagens, se sintam tentadas a refugiar-se num tanque. Mas isso não deveria servir para ignorar que naquele mesmo dia houve quem se posicionasse em frente ao canhão, de peito aberto. Quem, ao contrário de João Miguel Tavares hoje, não sabia que os tanques nãoiam disparar.

O cabo-apontador da história que encantou Tavares pode ser representativo de uma certa portugalidade. Portugal inteiro pode hoje ser fielmente representado pela personagem de Herman Melville, aquele Bartleby paradigma da passividade, divertidamente invocado por João Miguel. Não discuto isso. Mas só uma hermenêutica muito irreverente ousaria considerar que «Preferiria não o fazer», o mantra de Bartleby, é o slogan adequado ao 25 de Abril.

Por mais que custe ou não convenha à narrativa actual, a Revolução foi feita pelos tipos que se dispuseram a sair de Santarém e a enfrentar um regime, amolecido, é certo, mas que continuava a prender, a punir e a torturar. Um regime que tinha do seu lado gente que não hesitaria, como não hesitou, em disparar ou mandar disparar.

Enfatizar o papel do cabo-apontador Alves Costa em detrimento do de Salgueiro Maia é escolher a caricatura da pequena história em vez da dignidade do retrato, igualmente disponível.

O cabo-apontador, no artigo de João Miguel Tavares, teve o mérito de impedir «que a revolução se tornasse num banho de sangue», mas a coragem dos capitães que se dispuseram a fornecer sangue para esse «banho» parece ser menos relevante para a narrativa.

«Se há coisa em que os norte-americanos são realmente bons», diz Tavares, «é a criar heróis e memoriais». E conclui: «(…) nós não temos essa cultura em Portugal.» Pois não. E João Miguel empenhou-se em provar que não a temos — preterindo heróis inconvenientes a cabos de anedota.

Concluo com uma interpretação talvez também ousada (preferiria não o fazer, mas detestaria mais passar por bartlebyano): desvalorizar a coragem dos outros à distância de décadas e no conforto de uma boutade de jornal é, parece-me, uma cobardia.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Pequenos retratos infames (3): Henrique ‘Santa Comba’ Raposo

É ilegítimo e vil usar aspectos físicos das pessoas para atacar as suas ideias ou posições políticas. Ou para as defender. Na minha pós-adolescência ocorreu acusarem-me de Júlio Isidro e simultaneamente piropearem-me de James Dean. (Hoje fariam pior.) Mas isso aconteceu, tanto para o mal como para o bem, porque na verdade ninguém, eu incluído, sabia ou se interessava pelo que eu pensava. Apenas estava toda a gente, de novo eu incluído, fascinada (como no circo) pelos diferentes ângulos da minha fotogenia: de frente para o James; de lado para o Júlio (nunca subestimem o poder afrodisíaco de um nariz).

Mas deixemos Narciso no seu lago. Se tivermos nobreza de princípios e intenções, será deveras impróprio e torpe lembrar o quanto Henrique Raposo, naquela sua foto de míope, se parece com um oficial das SS ou com um agente da Gestapo. O exercício é contudo legítimo se reconhecermos ao alvo dos nossos insultos uma inteligência capaz. Precisamente porque sabemos que Raposo não ignora as circunstâncias, as conotações e a vanidade de muitos dos seus artigozinhos irreverentes e caprichosos do Expresso, podemos, se formos igualmente mesquinhos, responder-lhe com um «Heil Hitler para ti também». Ou, pronto, não exageremos, o caso não é assim tão teutónico. Raposo talvez apenas se pareça com um mangas-de-alpaca doutrinário, uma espécie de primito lisboeta e envernizado do homem de Santa Comba, para quem basta um simples e nacional manguito das Caldas. E se o caso for menos grave ainda — Raposo enquanto mero delfim de César das Neves, invejoso do sucesso daquele no anedotário luso (que não da avença, imagino que o Expresso pague mais) —, até podemos achar o Henrique boa companhia para um copo. Quem não gosta de partilhar a mesa com um tipo mesmo de direita? Eu gosto, e o único amigo que tinha capaz de achar que a culpa da crise era dos gajos do rendimento mínimo vacilou nas convicções quando o Governo lhe foi ao bolso e o deixou mal equilibrado às portas do desemprego. Sinto por isso falta de alguém a quem possa pagar com gosto umas rodadas enquanto digo: o que bebes, nazi do caralho?

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Revista de imprensa e blogosfera

Os conservadores, como aquelas pessoas que encaixam a realidade nas previsões do Zodíaco, discutem entre si de que forma a sua bibliografia muito culta e cool explica a actualidade. Para fingirem solidariedade social, concedem que se dê uma atençãozita ao trabalho de Thomas Piketty sobre a desigualdade económica. Vasco Pulido Valente, pelo seu lado, foi ler mais um livro de história da I Guerra Mundial que explica, claro, como o Estado Social e qualquer forma de socialismo são insustentáveis. Os comunistas à antiga andam excitados com as conquistas da Rússia e repetem para si mesmos que são direitos e benfeitorias. Putin, vê-se pelas fotos do fim-de-semana, anda literalmente inchado de orgulho com o sucesso das suas campanhas (há quem diga que é botox, mas são calúnias, macho russo não estica o rosto, é ilegal). Na Coreia do Norte, diz-nos um jornalista da Lusa, afinal não se deitam os tios aos cães e há liberdade de penteado (que é, como se sabe, um requisito mínimo para a liberdade de pensamento, que sob o couro cabeludo se abriga). Já só faltam 76 dias e a Europa parece mais bem preparada para o centenário de Sarajevo do que o Brasil para o Mundial de Futebol.

quarta-feira, 12 de março de 2014

A vitoriosa trimestralidade da LER (2)

Muitos anos, circunstâncias, instituições e pessoas contribuíram para o retrocesso da LER à periodicidade trimestral. Paulatinamente, o livro (e não falo em particular do romance) foi banido das televisões, das escolas, das universidades, dos jornais (guetizado em suplementos a que prescreveram uma dieta crescente), dos discursos políticos, das conversas em geral. Uma ou duas gerações de dirigentes partidários e institucionais particularmente plebeias, particularmente representativas da boçalidade e do arrivismo nacionais, foram suficientes para consumar o desaparecimento do livro — e a geração que lhes há-de suceder nem sequer consegue soletrar a palavra.

Considerando retoricamente que há uma saída para a crise, a LER é uma daquelas coisas que já não recuperaremos. A não ser que o país deixe de recrutar ministros e directores-gerais nas jotas, e que os ministros deixem de confundir “representar” com “mimetizar” o povo. A não ser que os intelectuais de direita parem de ter como maiores inimigos os intelectuais de esquerda, e estes, aqueles. São aqui menos relevantes as fracturas entre a esquerda e a direita do que as que existem entre o país e um leitor de livros, e a Resistência bibliófila precisa de todos os intelectuais — os que escrevem no Correio da Manhã e os que escolhem o Correio da Manhã para embrulhar o peixe.

domingo, 2 de março de 2014

Pequeno retratos infames (2)

Helena Matos

Há uns anos entrevistei Helena Matos numa esplanada da Gulbenkian e, mesmo que a incompetente entrevista que publiquei não dê disso conta, fiquei com a sensação perturbadora de que em alguns momentos estava na presença de um espírito fanático. Por certos assomos de cólera, certas obsessões, certa impiedade. Sacudi a ideia da cabeça mas a passagem do tempo, receio, viria a dar razão ao pressentimento. Na altura fui ter com ela porque gostava da sua iconoclastia no Público, mas hoje verifico com desolação que aquilo que eu achava ser rebeldia tinha muito de facciosismo à espera de vez. Assim que a direita neocon (muitos não gostam do termo, mas desconfio que ela não se importa), na sua versão lusa, subiu ao poder, o que era nela desalinhamento, pensamento politicamente incorrecto, revelou-se engajamento, zelo, farisaísmo. Não necessariamente por fidelidade a um partido ou a um governo, mas a um ideal, ao ideal. A investigadora parecia um ser livre, contestatário, questionador, mas era sobretudo uma opositora (muitíssimas vezes com razão) de quem governava à época. O tempo, que tudo apura, agiu nela empedernindo-lhe (ainda mais) o coração e barricando-lhe as ideias na viela mais obscurantista por onde às vezes andava. Lê-la sobre homossexualidade, arte, direitos dos cidadãos e não a imaginar com bigode e pêra de inquisidor do Santo Ofício, como um ayatollah de calças, é um feito de que já não sou capaz, lamento. O seu retrato grava-no-lo ela a fogo, diligentemente, com requintes e provavelmente orações fervorosas, artigo após artigo, post atrás de post.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Conservador

Nos anos do Independente sentia-me um pouco de direita. Não exactamente por partilhar de ideais politicamente conservadores. Mas porque, consciente ou inconscientemente, queria estar do lado da inteligência, do humor, da rebeldia, da iconoclastia, e estas coisas, como se sabe, no Portugal dos anos 90 estavam no Indy (e na Kapa). Posteriormente, aprendi que o liberalismo da direita era final bem pouco liberal em demasiados assuntos e afastei-me. De qualquer modo, o jornal e a revista tinham acabado. E a direita estava a ficar cada vez mais estúpida também no que se referia às artes e à paisagem, coisas para mim caras. Com a crise iniciada em 2008, um decidido misantropo como eu descobre a sua paradoxal costela humanista e solidária e chega-se mais à esquerda do que nunca, embora a nenhuma esquerda organizada politicamente.

Hoje sou sobretudo um desiludido do capitalismo, essa oligarquia, e um conservador. Sim, leram bem, um conservador. O que se vê na foto é parte do que eu conservaria rigorosamente sem alterações, sem uma árvore abatida, caso mandasse. Claro que se mandasse, também restringiria implacavelmente o acesso ao local. Todos os conservadores são na verdade antropófobos, e o direito à propriedade, que aqui reivindico, é instrumental para o cumprimento da vocação.


[Romanas, 17.11.2013]