domingo, 22 de junho de 2014

Elogio da impassibilidade

O suspense, a expectativa, os sustos, a angústia, as frustrações de assistir a um jogo de futebol têm uma certa equivalência aos prazeres da melancolia. Com a diferença de que no futebol ninguém suporta perder e na melancolia isso está implícito. Tive estes pensamentos enquanto antecipava gostosamente uma noite de mortificação em frente à TV, mas amigos muito mais ligados ao futebol do que eu dizem-me coisas como: «hoje, torcer pela selecção é mais ou menos como torcer pelos banqueiros, torcer por um negócio de outros que circunstancialmente são nossos compatriotas e usam as nossas cores». Postas as coisas nestes termos, se assistir ao jogo, fá-lo-ei de modo clandestino, anelando patrioteiramente (e por traição de classe) a vitória e reconhecendo maior justeza social na derrota.
Devo confessar ainda que a derrota me é mais conveniente também porque tenho ouvidos sensíveis e uma certa aversão estética a desfiles de carros buzinando inglória e jactantemente, como limusinas em Adis Abeba.
Ah, que saudades de sermos o povo melancólico que às vezes dizem sermos, impassível na vitória como na derrota.

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