quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013
Os filósofos e os hospitais
Countdown para 2 de Março: 2...
Peço desculpa aos dignos membros da espécie Equus a. asinus pela metáfora aviltante...
O cartaz anterior foi feito em Setembro de 2012, numa altura em que eu ainda achava que o n.º 1 do Governo era Pedro Passos Coelho. Face à realidade observável de quem realmente manda (tornou-se evidente que Passos Coelho é um mero poster boy), creio que é de justiça actualizar o cartaz:
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Trash lovers
Partilho com Vasco Pulido Valente um vício ou um defeito (apenas um dos muitos que ele tem, ok?): tenho demasiadas vezes uma necessidade inelutável de consumir policiais como narcótico, para distracção da vidinha medíocre. O cronista do Público lê policiais eu vejo policias, se os apanho. E filmes de ETs. Sempre que o Jumbo faz as suas feiras de um euro, eu encho uma cesta de DVDs. Depois passeio-os pela loja com a alegria de um adolescente ou de um titular de cartão de crédito da década passada, e de seguida, mais responsavelmente do que estes, devolvo a maior parte dos filmes à proveniência (faço uma triagem mental enquanto me abasteço de mercearia). Saio de lá, ainda assim, com meia dúzia deles, geralmente mais seis do que aconselhariam o bom-gosto e o bom-senso. Nem sempre reconheço para mim próprio o quanto isto é patético. Por vezes trago um Hitchcock ou um galardoado de Cannes para ludibriar a consciência. A comparação com outros prospectores de lixo também me serve de alibi. Ao contrário de alguns tipos que mergulham no contentor como porcos numa manjedoura, numa ânsia de encontrar pérolas que faz transbordar o recipiente, eu vou fazendo a selecção com pinças e torcidelas de nariz, e chego a arrumar o que os outros desarrumam, como se o lixo em montinhos fosse menos asqueroso. Ontem um dos trash lovers estava em franca competição comigo, mas, vendo-me atrasado no meu falso pudor, teve um gesto magnânimo: ofereceu-me uma das suas melhores descobertas. Aquilo começou por me desconcertar (eu estava a tentar passar despercebido, e não imaginava que me pudessem achar camarada numa coisa destas), e de seguida deu-me ares de superioridade. O tipo tinha-me estendido um exemplar de “A Super Patrulha” (“Crime Busters”), com Terence Hill e Bud Spencer, e por alguma razão eu achei, com uma risadinha snob, cretina, que a merda que levava no carrinho de compras se não comparava àquilo.
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013
O interesse da aposta
Countdown para 2 de Março: 3...
Só para lembrar (se preciso fosse...) as razões do nosso descontentamento.
Chapeleiro Louco: Vítor Gaspar
Lebre de Março: Pedro Passos Coelho
Gato de Cheshire: Miguel Relvas
Alice: Álvaro Santos Pereira
Coelho Branco: José Pedro Aguiar Branco
Rainha Vermelha: Assunção Cristas
Rainha Branca: Paula Teixeira da Cruz
Lagarta: Paulo Portas
Rato: Pedro Mota Soares
Tweedledee e Tweedledum: Paulo Macedo e Miguel Macedo
Humpty Dumpty: Nuno Crato
Segunda Lei de Newton
terça-feira, 26 de fevereiro de 2013
Para lá dos modelos
Countdown para 2 de Março: 4...
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Primeira Lei de Newton
Consulta de novo o horizonte e o ecrã do telemóvel, mas não há sinal dele, nenhuma das suas manifestações possíveis tem lugar. Apenas a passagem do tempo, assinalada com quatro dígitos que há muito deixaram de ser 14:00.
Então começa a descer o caminho pelo outro lado e os seus passos vão acelerando. Como uma bola que, depois de quase se deter ao chegar ao cume, ganhasse de novo velocidade na descida, a gravidade vencendo o atrito. Em poucos minutos adopta um passo furioso, como o daquelas outras raparigas que vão ao parque para caminhar, gastar calorias em marchas vigorosas, de fato de treino justo, garrafa de água na mão e um tagarelar ofegante. Ao fim de um quarto de hora de caminhada, descobrindo centenas de metros depois prazeres insuspeitados no esforço físico e remoendo o despeito amoroso, consegue-se imaginar a fazer aquilo para o resto dos seus dias: tornar-se viciada em caminhadas e presa a um encontro que não ocorreu. Não é preciso muito: umas sapatilhas com bom piso e um espírito romântico obsessivo, também ele obediente, na sua persistência, à primeira Lei de Newton.
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013
Nevoeiro
Countdown para 2 de Março: 5...
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domingo, 24 de fevereiro de 2013
Livros e estantes
Do «de» e do «da»
Countdown para 2 de Março: 6...
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Coisas de que gosto mesmo
Gosto dos governantes que adoptam medidas ruinosas atrás de medidas ruinosas, e que, perante a oposição popular, vêm humildemente reconhecer que «muitas das [suas] medidas não estão a ser bem comunicadas».
Não é um problema comunicacional, Álvaro! Não há gabinete de comunicação que transforme um cagalhão em cordon bleu.
sábado, 23 de fevereiro de 2013
Revisão antes do sono
Countdown para 2 de Março: 7...
Novo sinal de trânsito, a afixar em todas as fronteiras terrestres, marítimas e aéreas.
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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013
O protesto mais parvo da história universal dos protestos
Segundo o Público:
Consumidores pedem facturas em nome de Passos Coelho
O feitiço virou-se contra o feiticeiro. Em protesto contra a nova legislação que penaliza com multas até 2000 euros quem não pedir facturas, muitos consumidores começaram a pedir facturas com o número de identificação fiscal de Pedro Passos Coelho. Os dados do primeiro-ministro estão a ser divulgados em SMS e emails que se tornaram virais. As redes sociais estão a propagar o protesto.
[...]
O número de contribuinte do primeiro-ministro não é, contudo, o único que está a ser difundido através das redes sociais. Também o NIF dos ministros Vítor Gaspar e Miguel Relvas estão a ser divulgados e partilhados no Facebook e no Twitter com a sugestão de que sejam usados para o mesmo fim.
[...]
Em teoria, Passos Coelho pode até ser investigado pelas Finanças, por ter gasto um valor superior aos seus rendimentos. Vários serviços do Fisco contactados pelo Correio da Manhã — que dizem estar a par do que se está a passar — admitiram a possibilidade de o primeiro-ministro poder vir a ser alvo de uma investigação das Finanças, uma vez que existem “mecanismos de fiscalização automáticos que disparam quando um contribuinte gasta em facturas mais do que aquilo que declara como rendimento”.
Eis o protesto mais parvo da história universal dos protestos, por (pelo menos) quatro razões:
- Estou mesmo a ver Pedro Passos Coelho, Vítor Gaspar ou Miguel Relvas a serem “chateados” pelas Finanças para os fiscalizarem. O primeiro-ministro há tempos dizia que dormia perfeitamente — imagino o quanto a perspectiva de cair sob o martelo do fisco lhe esteja a tirar o sono...
- Mesmo que tal fiscalização ocorresse (o que, sabemos bem, nunca acontecerá), estes ministros, tal como quaisquer outros contribuintes “vítimas” de tal brincadeira, conseguiriam safar-se facilmente mostrando que é impossível terem estado em todos os sítios a que respeitam esses milhares de facturas (algumas certamente emitidas quase simultaneamente em locais afastados por dezenas ou centenas de quilómetros).
- Se é verdade, como no site «e-faturas» dizem, que o contribuinte final nem precisa (embora possa, como garantia) registar as facturas electrónicas emitidas com o seu NIF, pois terá automaticamente direito ao benefício fiscal quando o comerciante comunicar os dados das facturas que emitiu, então estes protestos só vão garantir que Passos Coelho e outros ministros “afectados” conseguem o máximo de benefício fiscal à custa de terceiros. 250€ (valor máximo) não os aquecem ou arrefecem, mas não deixa de ter piada que um protesto resulte em benefício fiscal para o alvo do protesto.
- Se é verdade que há falta de segurança na transmissão dos dados das facturas, podendo um desconhecido não autorizado (com alguns conhecimentos de informática) aceder a informação que viole o direito à privacidade dos contribuintes (onde estiveram, quando, o que compraram...), então este protesto tem também como consequência proteger a privacidade de Pedro Passos Coelho e dos demais afectados: ao emitirem tantas facturas com informação falsa, conseguem soterrar os reais consumos e a localização dos ministros, que efectivamente não se distinguirão dos consumos falsamente atribuídos a eles, pelo que tais informações (as verdadeiras) continuarão no foro privado. É um caso de privacidade garantida pela “multidão”. Passos Coelhos, Relvas e Gaspar agradecem.
Explicar o vazio
Sobre a “obrigação” de pedir factura
Leio no Público:
PCP vai propor fim das multas para quem não pede factura
O PCP quer revogar a norma que estipula multas quem não pede factura ou recibo, e vai apresentar na Assembleia da República uma proposta nesse sentido na próxima semana.
[...]
O PCP vai propor a eliminação “não do dever de pedir factura, mas da coima que penaliza os consumidores que não a queiram” [...]
O PCP está errado: a obrigação de pedir factura devia mesmo ser revogada, não apenas abolida a respectiva coima. Porque tal obrigação, ainda que consagrada na lei, é absurda: a lei que a consagra é abusiva.
Se o comerciante é já por lei obrigado a emitir a factura, por que razão tenho eu de pedir uma coisa que ele já é obrigado a fazer?
Vejamos: a lei já diz que ele pode emitir a factura sem dados do cliente final (pois eu não sou obrigado a dar-lhe os meus dados), e que o facto de eu não pedir factura não é desculpa para ele não cumprir o seu dever da emissão da dita. Se assim é, mais uma vez não faz sentido eu ser penalizado por não pedir factura, até porque a minha omissão/recusa não significa prejuízo para o Estado (a do comerciante, sim).
Mesmo o cenário em que ele pergunte «Quer factura?» e eu responda «Não», também nada configura de ilícito da minha parte. Eu estou simplesmente a dizer que eu não quero a factura — não estou a dizer que quero que ele não emita a factura. Ele que a emita, como é sua obrigação — ainda que sem os meus dados (se eu não os fornecer), e mesmo que eu me recuse a pegar nela ou simplesmente a esqueça no balcão. A factura tem de constar da contabilidade dele, não da minha.
A única situação em que as Finanças têm o direito moral e lógico* de penalizar o consumidor final, nesta questão das facturas, é se este for parte beneficiada em eventual fraude fiscal: se, por iniciativa do cliente ou do comerciante, a não emissão da factura tiver como contrapartida um desconto no preço final pago pelo cliente (por exemplo, o comerciante “não cobra” o valor do IVA se não houver factura a provar que a transacção sequer ocorreu).
* E não meramente legal, porque, repito, a lei actual é abusiva.
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013
Imagens que se quebram
Grândolas de manhã à noite
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
Prazer em conhecer
Voar no paradoxo
Olha, Zé, afinal não é apenas possível buscar o paradoxo — podemos também voar nele:
Fonte: I Love Charts
terça-feira, 19 de fevereiro de 2013
Fluir e reflectir
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013
A insistente alteridade
domingo, 17 de fevereiro de 2013
Minimizar o esforço
sábado, 16 de fevereiro de 2013
Mera hipótese
Conversa da treta das agências de rating
Público: «Moody’s corta rating da Standard & Poor’s»
Texto: Fernando Gouveia. Desenho: Matthew Buck. (Parece ter sido desenhado de propósito para o meu texto, mas não foi.)
Versão traduzida (perde-se o trocadilho entre «ranting» (dizer coisas sem sentido) e «rating», mas é a vida...):
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013
Pausa reflexiva
E o Oscar da Lógica vai para...
Por essa Europa fora há um escândalo com a venda de produtos ultracongelados (hambúrgueres, lasanhas, etc.) à base de carne de cavalo vendidos como se fossem de carne de vaca. Em vez de ir a um supermercado apurar se o escândalo está a afectar a venda de ultracongelados à base de carne picada, uma jornalista da SIC achou que fazia mais sentido ver de que forma a venda de cavalo por vaca afecta negativamente aqueles que vendem cavalo por cavalo.
Pergunto-me se à jornalista em causa lhe falta discernimento, ou se confia que nos falte a nós.
P.S. O título da reportagem, conforme ele surge no site da SIC Notícias, é enganador, por ambíguo: «Governo garante que não há registo de casos de carne de cavalo em Portugal». O que são «casos de carne da cavalo»? É preciso distinguir a venda de carne de cavalo como se fosse de outro animal (o que é ilegal) da simples venda de carne de cavalo (que é legal, se for assumido que é de cavalo). O título não faz essa distinção.
quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013
O número
Um preso recente, intrigado com o facto de os outros se rirem sempre que um deles gritava um número, foi informado de que esses números correspondiam a anedotas, que assim escusavam de ser repetidas por palavras. Quando, porém, ele gritou «63», ninguém se riu. Disseram-lhe que tudo depende da maneira como a anedota é contada. (1) Tal maneira ou se ajusta ao humor do objecto ou traduz uma inépcia que, por vezes, nem sequer é objecto de humor.
(1) John Allen Paulos (s/d), Penso, Logo Rio, Lisboa, Editorial Inquérito, p. 52.
O homem é bicho fodido de se aturar
Os dados dos casamentos e divórcios entre pessoas do mesmo sexo, desde 2010, são claros: os casamentos entre homens (268) representam menos de metade dos casamentos entre mulheres (597), mas os divórcios entre homens (20) são o dobro dos divórcios entre mulheres (10).
Com todas as reservas que as estatísticas de pequenos números nos merecem, vou arriscar uma conclusão: o homem é bicho fodido de se aturar.
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013
O breve intervalo
terça-feira, 12 de fevereiro de 2013
Será que a gente se entende?
(1) Cf. Pedro González Calero (2009), A Filosofia Com Humor, Lisboa, Planeta Manuscrito, p. 125.
(2) Idem.
Beatas e expressões
E no entanto erramos frequentemente no jogo de adivinhar se uma fotografia no JN é de vítima ou carrasco. Não raro os mortos têm cara de vilões e os assassinos expressão sofredora.
Freak show
Depois esfrego os olhos e noto que é apenas um desfile de Carnaval, um que não precisou de investir muito nos disfarces para alcançar aquele efeito. É uma ronda dos arredores que desceu à cidade percutindo bombos e causando pasmo aos junkies do bairro e a mim. Ou só a mim: os junkies nem assistem ao triste cortejo, apenas coincidiram na rua no momento do desfile, a caminho dos seus habituais compromissos inadiáveis.
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013
Buscar o paradoxo
domingo, 10 de fevereiro de 2013
O prisioneiro
A patanisca gourmet da música
Começo com uma confissão, que reconheço vergonhosa, e que certamente abortará qualquer ilusão de autoridade em tudo o que eu disser depois: só há coisa de uma semana sei realmente quem são os Virgem Suta.
O facto é que não tenho televisão, nem rádio. Parecendo que não, isso tem as suas consequências, e nem sempre positivas (que também as tem). Uma delas é que um bom número de músicas e intérpretes surgem, alcançam a fama, definham e desaparecem sem que eu dê sequer conta da sua existência.
Esse é o caso extremo. O mais das vezes até chego a ouvir algumas dessas músicas, ou trechos delas, dada a sua omnipresença: no rádio do carro de um amigo que me dá boleia ou do autocarro que tomo de manhã para o trabalho, na televisão alheia em frente à qual pouso brevemente ou passo de raspão, na banda sonora do ócio consumista ou mirone dos estabelecimentos comerciais. Mas o mais certo é o nome do músico, cantor ou banda não ser anunciado, ou não o ser nos breves segundos ou minutos de audição a que tive direito. (Lembro-me dos longos meses em que, com certa frequência, me cruzava com Pasión de Rodrigo Leão, na voz de Lula Pena, pensando que era de Luz Casal ou outra espanhola compatível com a minha ignorância...)
Viceversamente, há nomes da música, por vezes acompanhados da respectiva imagem, que me são familiares (estão em tudo quanto é capa de revista, noticiário e quejandos), mas cuja sonoridade desconheço totalmente. Incluem-se neste rol Lady Gaga, Paco Alborán, Justin Bieber e Rihanna, entre outros. (Não excluo a possibilidade de já ter ouvido algum tema destes intérpretes, sendo eu incapaz de associá-los mutuamente.)
E assim chegamos aos Virgem Suta. Estiveram na semana passada na minha cidade e, apesar de o nome não me soar totalmente estranho, foi apenas por recomendação de um amigo que fui ao concerto, descobrindo então que já tinha ouvido aqui e ali, ainda que incompletamente, um dos seus temas (Linhas Cruzadas, na versão com Manuela Azevedo).
Digamos que foi uma surpresa. Uma belíssima surpresa — ainda que só possível por mor da já assumida ignorância. (“Descobrir” os Virgem Suta em 2013 inscreve-se na mesma escala de mérito de descobrir o caminho marítimo para a Índia em 1755.)
Fui imediatamente conquistado pela deliciosa mistura de sonoridades pop e popular portuguesa, nalguns casos, com uma mestria inaudita, sobrevoando (sem nunca se molhar) o extremo mais kitsch do espectro: o “pimba” (por exemplo, em Tomo Conta Desta Tua Casa, Vovó Joaquina e Luso Gentleman).
Salvam os Virgem Suta (não apenas os resgatam: coroam-nos de louros, de facto) a excelência e o humor das letras, a sofisticação dos arranjos, com inesperados melódicos, e a personalidade da interpretação vocal de Jorge Benvinda. (Mérito também para o produtor: Hélder Gonçalves, dos Clã.)
Dizem-me que o vocalista do grupo tem, em Beja, uma tasca com toques de restaurante gourmet. Este facto e a música dos Virgem Suta misturam-se na minha cabeça e trazem-me à lembrança Pedro Barroso, responsável pelo restaurante do Armani Hotel Dubai, situado na torre mais alta do mundo, a Burj Khalifa. Em 2010, na inauguração da unidade hoteleira de luxo, o chef português escolheu como iguaria destinada a deslumbrar os convidados da elite mundial... pataniscas de bacalhau com arroz de feijão. Isso mesmo: um dos incontornáveis petiscos de qualquer tasca lusa elevado, pela mestria de Pedro Barroso, aos píncaros da cozinha internacional.
Pela mão de Jorge Benvinda e Nuno Figueiredo, também as sonoridades da música popular — e até popularucha — portuguesa se elevam a outros, mais estratosféricos e requintados, níveis de qualidade: os Virgem Suta são a patanisca gourmet da música.
sábado, 9 de fevereiro de 2013
Dizer não
sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013
Caminhando no fio da navalha da Semântica?
Segundo o DN, Carlos Zorrinho (PS) pediu desculpa ao novo Secretário de Estado do Empreendedorismo por ter dito há dias na SIC Notícias que
[Franquelim Alves] é uma das pessoas que o Banco de Portugal considerou não estar em condições de deter atividades na área financeira.
Segundo o diário, o «Banco de Portugal [...] desmentiu a informação veiculada por Zorrinho», num comunicado onde se lia que
O dr Franquelim Alves não desempenha, desde Novembro de 2008, funções sujeitas a registo no Banco de Portugal.
Eu é que peço desculpa, mas este excerto do comunicado do Banco de Portugal NÃO desmente o líder parlamentar do PS. A declaração do Banco de Portugal é perfeitamente compatível com a afirmação de Carlos Zorrinho. NÃO estou a dizer que Zorrinho está correcto (não faço a mínima ideia), mas se é dessa forma que no Banco de Portugal «desmentem» seja quem for, então está «visto e ouvisto» que têm de ter umas lições de português (e de lógica).
Ou talvez não. Talvez quem redige os comunicados do Banco de Portugal domine bem o português e a lógica — e a técnica de caminhar no fio da navalha da semântica.
O grande equívoco
Nem tudo é repetível
Hoje, num reflexo daqueles tempos, desloco-me pela casa apagando a luz dos compartimentos atrás de mim, mesmo que tencione voltar, enquanto acendo a dos que me ficam no caminho. Por vezes fico às escuras alguns metros, se os interruptores não estão próximos e acho supérfluo iluminar uns poucos passos. Não me perturba este jogo. Como não me perturba ir a pé para o trabalho. O ambiente ganha com isso. Eu gasto menos com isso. Perturba-me que venha a precisar de uma mercearia que venda fiado e não a encontre. Não encontre mercearias de espécie nenhuma. Nem tudo do passado é repetível. No portugalzinho provinciano e comunitário de Salazar era possível levar uma grande lista de compras e dinheiro nenhum na carteira. Os franchises de hoje, mesmo quando apresentam rostos mais simpáticos por detrás da registadora, não têm a mesma confiança na palavra dada. Além de que, suspeito, a companhia da electricidade é hoje mais despida de escrúpulos na hora de definir tarifários.
A humanidade por detrás do culto
Espreitei e vi como ardiam velas em latinhas que parecem de refrigerantes, com gravuras no exterior, vi plantas em vasos que dão aos nichos um certo ambiente de estufa, vi as vassouras que diariamente varrem os pequenos compartimentos, as bisnagas com que se borrifam as plantas e a cerâmica ou o barro pintado das figuras, vi na sua mundana caixa de supermercado o rolo de papel de alumínio de onde saem os fundos que protegem os tabuleiros das velas, vi a prosaica caixa dos fósforos que acendem as velas, vi o saco preto reciclável onde se acumulam as latinhas já usadas — vi, enfim, os bastidores de oratórios ou santuários demasiado pequenos para terem resguardados da vista os produtos e os objectos que revelam a humanidade por detrás do culto.
Decerto não veria nada disso se tivesse ido ali apenas para rezar.
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013
O escriba sem assunto
O que está mal muda-se
Muita gente manifestou a sua indignação com a nomeação de Franquelim Alves, ex-administrador da SLN (proprietária desse famoso buraco chamado BPN) para Secretário de Estado do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação. Variando aqui e ali os pormenores do vernáculo usado, a ideia-base era que o curriculum vitae de tal pessoa era inadequado à assunção de tal cargo.
Permitam-me que discorde, ou melhor, que discorde da perspectiva por que o problema foi observado.
A questão não é que Franquelim Alves não serve para esta Secretaria de Estado. A questão é, isso sim, que esta Secretaria de Estado não serve para Franquelim Alves. Não se mude o homem — mude-se o nome da Secretaria. Chamemos-lhe Secretaria de Estado do Chico-Espertismo, Compadrio o Inovação Contabilística e teremos a pessoa com o curriculum vitae adequado à função.
Eventualmente ou o princípio da incerteza
Hoje, num filme que me passou pelo ecrã, a expressão «in the end everybody dies» foi traduzida como «eventualmente todos morrem». Fiquei baralhado. O tradutor teve bizarras dificuldades com a expressão original, procurou uma correspondente em inglês e só então traduziu a ideia (com o erro habitual)? Terá imaginado uma primeira tradução do género «todos acabam por morrer», feito de seguida a retroversão para, sei lá, «everyone eventually dies» e só então se sentiu capaz de balbuciar alguma coisa em português? Ou é na verdade o grémio das legendas partidário do princípio da incerteza até no que se refere à morte?
Os habitantes do parque: notas para um inventário
O parque não é habitado por gnomos ou outros seres mitológicos, pelo menos que eu saiba. Nem há assim tanta gente que se possa dizer que é do parque. Às horas que o percorro, de dia, lembro-me de um clérigo de uma religião alternativa, com a sua gabardina dois números acima, um saco na mão direita e frequentes olhos no céu; um reformado pesadão de bengala e cão idoso pela trela que tem um pedaço do parque como quintal; um advogado e um pastor alemão com o mesmo ar de poucos amigos, ambos sem açaimo, numa caminhada enérgica antes do expediente da tarde; duas ou três senhoras indistintas e decididas no seu fato-de-treino claro e no seu trekking pós almoço; os habituais funcionários camarários vestidos de verde-almeida e responsáveis pela relva, na parte em que o parque é relvado; um senhor com luvas, protectores de orelhas e eventuais problemas de colesterol ou próstata cumprindo a prescrição médica... Quase todos os outros são meros transeuntes que atalham pelo parque a caminho de qualquer destino alhures, geralmente indiferentes ao caudal do rio, à azáfama da passarada ou ao estádio da floração. Ao final da tarde a fauna aumenta, mas malogradamente outras ocupações impedem-me de lhe fazer o inventário. E às minhas horas da noite já quase não sobra ninguém: um ou outro corredor de calças de lycra, uma ou outra parka com gente anónima dentro.
Há contudo nos últimos tempos um sujeito careca nos seus quarentas que se posiciona durante a hora de almoço numa escadaria com vista para uma das represas. Talvez tenha agora descoberto que aquele é um bom sítio para almoçar. Talvez tenha voltado a fumar e ali, meio camuflado pela vegetação, não o assolem tanto os remorsos nem a censura de familiares ou colegas. Talvez seja vítima de desgosto recente e os olhos com que vê a queda da água não sejam indiferentes à melancólica beleza da corrente. Talvez, enfim, seja apenas um dealer a variar de ponto de distribuição por gosto ou cálculo e o telemóvel lhe trema nas mãos em resultado de um mercado em alta e não de um astral em baixa.
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013
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A partir de “Portugal, finis terrae”, de Pedro Rosa Mendes
A grande singularidade do texto de Pedro Rosa Mendes, a par da sua opinião informada e da coragem com que ele a expressa, é a independência em relação às instituições e em relação às tendências político-partidárias. Há, à esquerda e à direita, outras pessoas no país que fazem diagnósticos coincidentes, pelo menos em boa parte, mas as suas relações afectivas ou de interesses, o seu comprometimento ou proximidade aos partidos, limitam-lhes a coerência, tornam-nas inconsequentes, inúteis ou perniciosas. O mundo dos comentadores políticos é geralmente um território de canto coral ou onde drapejam bandeiras.
É hoje para mim claro que o futuro português não pode ser construído pelos partidos, estes partidos. Dos municípios ao Governo, o país precisa de um reset, de se reinventar politicamente, e isso não se consegue fazer com gente tão implicada, tão cúmplice, tão presa aos métodos e aos desígnios das facções. Não se consegue fazer com protagonistas que andam pelo país como mercenários a repartir despojos ou por militantes que estão na política tão estupidamente como no futebol.
Não se trata de tirar razão à esquerda ou à direita, de invocar um hipotético centro virtuoso. Não tem nada que ver com esta posição ingénua, igualmente maniqueísta, de consensos pantanosos.
Trata-se de dizer abertamente que os partidos portugueses são cancros na sociedade e que detêm, em doses semelhantes, a culpa da situação que vivemos. (Da culpa que podemos reivindicar como nacional — nunca deixemos a «Europa» de fora disto.)
Como diz Rosa Mendes, «não haveria Passos Coelho sem Sócrates». Mas quem pode verdadeiramente negar que Passos Coelho seria o Sócrates da década anterior e Sócrates o Passos Coelho destes anos se a História lhes tivesse concedido vencer eleições em períodos diferentes? Quem pode jurar, sem hipocrisia ou cegueira, que distingue os Governos por muito mais do que o tempo e as circunstâncias em que lhes calhou governar?
Há decerto elementos no actual Governo que têm as melhores intenções, mas que liberdade lhes deixam ou que trabalho farão que não seja arruinado pelos colegas menos escrupulosos e mais oportunistas? (E mais poderosos.)
Um país não se devia governar, mesmo em tempos de crise, com sebastianistas, revolucionários, salvadores nomeados pelo Presidente ou pelas instituições (nacionais e estrangeiras). Mas também é certo que jamais se governará com a actual classe política.
A democracia ainda não foi destronada do pódio de melhor sistema de governo, e não me parece provado que a democracia representativa tenha os dias contados, que mereça ter os dias contados. Apenas precisa de outros representantes. Precisa de uma faxina.
O problema é que em Portugal é muito difícil formar partidos políticos. Não porque as leis e a burocracia sejam particularmente inexoráveis, mas porque um novo partido em Portugal é sempre considerado uma coisa excêntrica, terá previsivelmente um eleitorado da dimensão daquele que têm os partidos monotemáticos, de âmbito e programa circunscritos a uma ideia e um punhado de simpatizantes que se conhecem pessoalmente.
A vileza dos representantes em Portugal é pelo menos igualada pela estupidez dos representados. O eleitorado português é suficientemente perspicaz para reconhecer um cretino quando vê um — mas é também suficientemente estúpido, ou está suficientemente implicado, para votar de novo nele.
Parecemos condenados a concluir como Pedro Rosa Mendes concluiu o ensaio dele, utópica ou apocalipticamente: «Resta, pois, a rua, morada comum da raiva.» De facto, as possibilidades anteriores à rua, numa escalada de tomada de poder, parecem condenadas ao fracasso. Não se imagina que os independentes bem-intencionados dos anos recentes da política portuguesa possam formar um novo partido, mais sério e competente; não se imagina que esse partido fosse votado, caso pudesse formar-se; mas também não se imagina que os partidos actuais possam gerar anticorpos suficientemente poderosos para debelar a sua infecção interna. Será um problema de imaginação aquilo que nos aflige? Ou de coragem (de fazer e votar diferente)?
* Quem não conseguir comprar a Ler de Janeiro, pode encontrar aqui o
ensaio de Pedro Rosa Mendes: http://www.mynetpress.com/mailsystem/noticia.asp?ref4=4%23k&ID=%7B05DAEA92-2ABB-42ED-89ED-7F3F0B378A5D%7D
Mulher a rezar
Antes de virar a esquina e iniciar a rampa do Calvário, há de cada lado da estrada uma capelinha ou pequeno santuário com portão em barras de ferro. De um lado está Cristo carregando a Cruz, do outro uma santa, provavelmente uma das várias manifestações da Virgem. A mulher reza daquele lado. Numa observação menos atenta, não se diria que reza: posição do corpo a três quartos, como quem está de passagem e mal se deteve para uma espreitadela curiosa; sapatos e roupa de sair em passeio; cabelo acabado de lavar no cabeleireiro; a carteira na mão direita, a de fora, exactamente como quando ela se encosta ao vidro de uma montra a passar os olhos pelos saldos ou pela nova colecção. Dir-se-ia visitante, turista, mas a mão esquerda, firmemente agarrada a uma das barras do portão, impregnando-se de ferrugem, segurando-se ali como náufrago à corda salvífica, confirma que reza.
O nome das coisas
O debate, em França, sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a adopção por casais homossexuais entrou no quelho da discussão à volta dos nomes das crianças: que sobrenome(s) seria(m) aposto(s) aos nomes próprios dos petizes?
A lei parece seguir no sentido de que os sobrenomes de ambos os membros do casal figurem no nome da criança, pelo que a Direita francesa se levantou em ruidoso protesto à la Diácono Remédios: «Qualquer dia» temos também os nomes das crianças de casais heterossexuais a serem desfigurados com os sobrenomes das suas mães! Sacré Bleu!
O problema, está bom de ver, não é de machismo, non! Nem sequer de conservadorismo, dis donc! Como explica o deputado Marc Le Fur, o problema é que os nomes de origem portuguesa são «frequentemente longos» (culpa da mãe, évidemment). Num país onde palavras como «professor» e «director» não têm feminino, facilmente se conclui que o problema é esse: o pragmatismo francês tende manter os nomes convenientemente breves, pela “poda” do nome da mãe, e assim deverá continuar a ser!
Pela lógica da Direita francesa, «Valéry Marie René Georges Giscard d’Estaing» é um nome «curto» — porque os quatro primeiros são nomes próprios e os dois últimos vieram-lhe ambos do pai («comme il faut»). São também curtos nomes como «Charles André Joseph Pierre-Marie de Gaulle», «Georges Jean-Raymond Pompidou», «François Maurice Adrien Marie Mitterrand», «Nicolas Paul Stéphane Sarközy de Nagy-Bocsa» («Sarközy de Nagy-Bocsa» provêm-lhe todos do pai...) e «François Gérard Georges Nicolas Hollande», só para citar alguns.
Já «Rui Sá do Ó» (em que o Sá lhe vem da mãe...) é um nome um horror de longuíssimo! Zut alors!
terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
Rumo definido
segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013
Suprimir o tempo
Georgia O' Keeffe, Era Azul e Verde, 1960. |
Se formos capazes de suspender o pensamento, seja nas suas modalidades concretas, seja nas abstractas, colocando-o fora de jogo ou deixando que dele subsista só um vestígio inoperante, e lograrmos, em seguida, fixar por inteiro a consciência nas sensações, até realizar uma absoluta sinestesia, ficando assim os sentidos, como diz Almeida Garrett, «todos num confundidos», teremos aniquilado o tempo e alcançado uma unidade sem distância nem conflito. Resta naturalmente esclarecer que tipo de consolo isso nos traz.
A guitarra que falava
Por timidez, desinteresse ou incompetência, sempre fui nalguns assuntos um tipo um pouco retardado. Quando a isso se somavam as dificuldades financeiras, eu podia ser bastante neandertal em relação à restante rapaziada. E misantropo.
Um dia no intervalo das aulas um colega quis partilhar comigo a música que ouvia no seu novo walkman. Senti-me honrado, naturalmente, mas também assustado. Sabia que existiam mas nunca tinha experimentado ouvir música numa coisa daquelas. Qual seria a sensação? Como se ajustava o aparelho nas orelhas?
Acontece que o colega não queria apenas que eu ouvisse a música, queria que reparasse como o guitarrista dos Lynyrd Skynyrd fazia falar a guitarra. Eram muitas experiências novas para tão pouco tempo. Walkman. Guitarras que falam. Lynyrd Skynyrd (quem?). Ajustei os auriculares e a primeira coisa que disse ou pensei foi que a música parecia vir de todo o lado, ou estar dentro da nossa cabeça. O colega sorria. Eu ainda não tinha interiorizado a experiência e, por educação, para não abusar da generosidade, já me estava a obrigar a tentar decifrar o que queria ele dizer com uma guitarra que fala. Havia um solo, sim, mas por mais que me esforçasse não entendia nenhuma palavra — e já sabia algumas coisas de inglês. Para mim não havia nada de metafórico no que me fora pedido: eu estava mesmo a tentar ouvir uma guitarra a falar, balbucios que fossem.
Fingindo conhecimento e afectando desinteresse, acabei por dizer que sim, de facto era uma guitarra eloquente, embora não apreciasse muito a música.
(Podia ter contemporizando mais, sido menos herético, dizendo-lhe apenas que «não era sensível ao tema» — se fosse capaz de usar com rapidez a ambiguidade das palavras, de pensar a tempo na utilidade da sua amplitude semântica para uma boa convivência social.)
domingo, 3 de fevereiro de 2013
O Leonhard Euler da (baixa) política nacional
Escreve Jorge Buescu no segundo capítulo de O Fim do Mundo Está Próximo? (Gradiva, 2007):
Leonhard Euler (1707–1783) foi muito provavelmente o maior génio matemático de todos os tempos. Foi indiscutivelmente o matemático mais produtivo de sempre, em quantidade e qualidade. [...]
[...]
Euler fez um oceano de contribuições fundacionais para o cálculo diferencial e integral, as equações diferenciais ordinárias e parciais, a teoria dos números, a geometria, a álgebra, a mecânica, a hidrodinâmica, a astronomia, a topologia e a teoria dos grafos.
[...]
Mesmo um cientista de estatura gigantesca fica geralmente imortalizado por uma contribuição central à qual o seu nome fica para sempre ligado: assim falamos na lei de Arquimedes, na gravitação de Newton, na hipótese de Riemann ou na relatividade de Einstein. No entanto, se um matemático se referir no abstracto ao «teorema de Euler», a maior parte das pessoas não saberá qual o ramo da matemática em discussão, tal a esmagadora abrangência e importância do legado científico de Euler.
Faço zapping entre telejornais, folheio os diários e semanários, salto de blogue em blogue — e sou assoberbado por uma omnipresença: Miguel Relvas. Há, associado ao seu nome, escândalos para todos os gostos: assim de repente, temos o caso «Relvas/Universidade Lusófona», o caso «Relvas/Secretas», o caso «Relvas/jornal Público», o caso «Relvas/Passos Coelho/Tecnoforma», o caso «Relvas/Viagens fantasmas»...
Com a devida vénia, peço emprestado e rescrevo um excerto do livro de Jorge Buescu:
Mesmo um político de baixíssima estatura fica geralmente imortalizado por um escândalo central à qual o seu nome fica para sempre ligado: assim falamos no envolvimento de Armando Vara no processo «Face Oculta» ou de Paulo Portas no «Caso Submarinos», no «Caso Fax» de Carlos Melancia, ou no «Caso Costa Freire». No entanto, se um comentador se referir no abstracto ao «Caso Relvas», a maior parte das pessoas não saberá qual o ramo da baixa política em discussão, tal a esmagadora abrangência e importância do legado escandalístico de Miguel Relvas.
Miguel Relvas é o Leonhard Euler da (baixa) política nacional!
P.S.1 Jorge Buescu não nos informa quanto a quem seria o n.º 2 do ranking do mérito matemático. No da baixa política nacional, a “honra” caberia a José Sócrates: casos «Sócrates/Universidade Independente», «Sócrates/Freeport», «Sócrates/Face Oculta»...
P.S.2 A imagem que acompanha este texto foi retirada do magnífico blogue WeHaveKaosInTheGarden, que tem muitas mais jóias de igual quilate (uma boa parte delas protagonizadas pelo nosso Euler politiqueiro).
Botas de autoridade e focinhos de porco
Do filme Platoon retive uma imagem em que certo soldado pontapeia o focinho de um porco (1). Recordei-a enquanto assistia ao vídeo que mostra um agente da GNR, na A1, a desferir um golpe similar. Concluí existirem botas que desejam, por vezes, sentir viva a autoridade que transportam. Focinhos de porco ajustam-se, com vantagem, a tal desiderato, porquanto a contestação do suíno será breve: nem o queixume irá além de um guincho nem o protesto excederá um ronco.
(1) O momento exacto pode ser visto aqui, após o minuto 46 (mais propriamente aos 46 minutos e 15 segundos).
sábado, 2 de fevereiro de 2013
«O sono das maçãs»
Se alguém quiser, como García Lorca, «dormir o sono das maçãs» (1), de que modo exprimirá o resultado? O problema não diz só respeito à natureza dos qualia, ou qualidades sentidas das experiências, mas também ao reconhecimento de que se passou por tal sono. Trata-se de, permanecendo humano, entrar no fruto em causa, imergir na sua inconsciência — e sabê-lo, depois, ao despertar. «Dormir o sono das maçãs» seria aceder, por inteiro e sem distância, ao lugar do inefável.
(1) Federico García Lorca (s/d), Divã do Tamarit, Lisboa, Vega, p. 47.
Surviving in Portugal
O Governo lançou há dias o programa “Living in Portugal”, que pretende promover a venda de imóveis de luxo (acima de meio milhão de euros) a cidadãos estrangeiros.
Segundo um dos vários governantes presentes na cerimónia, a estratégia passa por veicular a mensagem de que Portugal é um bom lugar onde se ter uma segunda residência.
É verdade. Fodido é ter cá a única.
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013
Fechar a conversa
Quando em conversa telefónica, há quem deseje, consciente ou inconscientemente, ser o autor das palavras que fecham o diálogo, repetindo então a fórmula de despedida as vezes necessárias a que isso possa acontecer. O problema surge se o interlocutor seguir idêntico padrão comunicacional. Em circunstâncias do género, é provável que o natural embaraço acabe por se resolver se ambos insistirem num adeus que se renova, mas gradualmente diminuindo o tom, até que este se extinga no silêncio.
Tédio News: o regresso do rural
Como texto do corpo da notícia recorri a um artigo de Miguel Gaspar (Público). Uso-o aqui sem autorização — mas quase não se consegue ler.